Severino. O
ARTISTA que pra mim não morreu!
Por Aurivânio Andrade.
“Papai o “Chaves” morreu”? Indagou-me o meu filho caçula Pedro Hernandes de apenas 04 anos ontem à tarde se referindo, mesmo sem saber, a perda irreparável de Roberto Bolaños - o “Chaves” que “arrancou” risos de várias gerações durante as apresentações do seu programa insubstituível, transmitido pelo Sistema Brasileiro de Televisão – SBT durante décadas. Confirmei que sim, mas logo “remendei” dizendo a ele que “o Chaves” estava no céu brincando com outras crianças de lá. Pedro entendendo bem o que eu dissera, completou: “ah, tadinho! Eu gostava tanto dele.” Nessa hora lembrei-me de uma perda irreparável que as crianças da minha época tiveram com a morte de Severino Monteiro, conhecido por “Severino Calungueiro” ou “Severino dos calungas”. Prometo no decorrer dos relatos, explicar esses substantivos que acompanhavam o sujeito.
“Papai o “Chaves” morreu”? Indagou-me o meu filho caçula Pedro Hernandes de apenas 04 anos ontem à tarde se referindo, mesmo sem saber, a perda irreparável de Roberto Bolaños - o “Chaves” que “arrancou” risos de várias gerações durante as apresentações do seu programa insubstituível, transmitido pelo Sistema Brasileiro de Televisão – SBT durante décadas. Confirmei que sim, mas logo “remendei” dizendo a ele que “o Chaves” estava no céu brincando com outras crianças de lá. Pedro entendendo bem o que eu dissera, completou: “ah, tadinho! Eu gostava tanto dele.” Nessa hora lembrei-me de uma perda irreparável que as crianças da minha época tiveram com a morte de Severino Monteiro, conhecido por “Severino Calungueiro” ou “Severino dos calungas”. Prometo no decorrer dos relatos, explicar esses substantivos que acompanhavam o sujeito.
Severino Monteiro ou Seu
Severino como
fomos ensinados pelos nossos pais a chamar as pessoas mais velhas, veio das
cercanias das regiões serranas dos “BASTIÕES”
distrito da cidade de Iracema/CE,
nos idos dos anos 40 para trabalhar nas terras de Antônio Torres na cidade de Viçosa/RN. Anos depois, conhecia e
casava-se com Raimunda Tavares, também conhecida por todos daqui como: “Mundica” ou “Jopira” como exclusivamente
gosto de chamá-la.
Severino foi um dos principais protagonistas
do cenário artístico e cultural na
minha “VIÇOSA CIDADE” quando da minha
época de criança. O mesmo se destacava não só em Viçosa, mas em todos os vilarejos
ou que fossem nas fazendas da nossa região se estendendo pelas regiões de caatinga
dos estados da Paraíba/PB, do Rio Grande do Norte e do Ceará/CE, sendo este último o seu
estado de origem. Suas únicas “ferramentas” de trabalho se resumiam a uma bolsa
já um pouco desgastada pelas viagens do sertão onde levava pouquíssimas peças
de roupa; uma mala de cumaru recheada de calungas (espécie de bonecos
artesanais feitos de madeira e tecido) daí a origem do apelido de “Severino Calugueiro” e claro, sua
criatividade e o seu talento. Tudo isso era transportado em cima de uma bicicleta
Monark (03 coroas) ano 68. O mesmo era precavido, pois, conduzia uma “bomba”
para encher os pneus da mesma, caso viesse a ocorrer algum empecilho durante as
viagens - esta era amarrada no varão da sua bicicleta. Como companheiros de
estrada o mesmo contava com seu filho Ozanan
Monteiro (pandeirista) e Chico de
Elvira (Sanfoneiro). Essa dupla era responsável pelas animações musicais das
apresentações culturais que o mesmo fazia nas casas grandes das fazendas, nas casas
de farinha, nos antigos engenhos de moagens de cana de açúcar etc, etc. Os
mesmos levavam de 15 dias a um mês para voltarem pra casa e reverem suas
famílias. O elenco que compunha sua peça teatral de fantoche era numeroso e
nominado com nomes típicos de personagens do nosso sertão, inclusive todos nominados
por ele. Eis-los: João Redondo e
suas duas filhas: Maroquinha e Maria
Mirioza; Benedito Coco e Cimiro – esse último era cantador. O
mesmo gostava de cantar cantigas que retratavam o sertão. Eis o refrão de uma: [....“Ô minha viola. Ô
viola boa.Ô minha viola, viola dos sertões das alagoas....”],
Seu Macumba - esse era um andarilho que percorria as estradas do sertão;
O padre João sem Cuidado cuja
atribuição era fazer o casamento de Benedito
Coco com uma das filhas de João
Redondo(Maroquinha) que o mesmo tinha desonrado; três soldados: Fusquete, Panelada e Fuçura e um
Sargento de nome Estufôr. Esse quádruplo
era responsável pela segurança e tinha uma árdua missão que era de manter a
ordem e prender Benedito Coco. Além
de retratar os personagens típicos do nosso sertão, o ARTISTA até então anônimo se preocupava também em retratar
a Fauna da nossa região. Somando aos
protagonistas já citados, o mesmo criara na sua peça teatral de fantoche, a
figura de um BOI nominado por ele de
“Boi Surumbim” e uma enorme cobra que comentarei mais adiante. A
função do Boi Surumbim na peça era
“assombrar e chifrar” Benedito Coco
até por fim a sua vida.
Benedito Coco era um negro forte e valente que
levava a vida fazendo baderna, brigando com todo mundo, desonrando as filhas
alheias, desafiando a polícia, enfim. O mesmo andava armado com uma faca
peixeira (arma típica dos sertanejos da época)dando muito trabalho a polícia e
desafiando todos que encontrava pelo caminho. Até o Boi Surumbim o mesmo desafiava. Durante a apresentação era comum visualizarmos
as constantes brigas de faca envolvendo
Benedito com a polícia e com João
Redondo onde o mesmo acabava matando este, inclusive ceifando também a
vida de todos os policias. Os únicos personagens que o mesmo tinha medo era de
uma “alma” e de uma cobra enorme que
aparecia no final do espetáculo assombrando Benedito e toda a molecada que se fazia presente. Inclusive eu.
Confesso que a presença daquela “alma”
mim causava arrepios e mim tirava o sono naquela noite, passando a dá muito
trabalho aos meus pais. Afinal, qual é a criança que não tem medo de almas? A alma e cobra tinham funções distintas na peça teatral de Severino. A
primeira assombrava. A última acabava asfixiando e engolindo o valentão. Assim,
terminava mais uma noite de espetáculo, entre risos, palmas, arrepios e o medo
das crianças que mesmo assustadas retribuíam o talento de um dos principais ícones da Cultura Popular do
nosso povo onde orgulhosamente levava o nome da nossa pequenina Viçosa a diversos lugares por onde
andava. Aproveito e faço uma pergunta aos
meus RARÍSSIMOS leitores de Viçosa. Será que os “artistas” de hoje,
(eleitos por muitos daqui) falam de Viçosa onde estão? Duvi-dê-Ó-dó.
Aqui na nossa cidade o mesmo fez várias apresentações nos “salões”
das casas de Ananias Mafaldo, Zé Pedro seu genro, na garagem de Mestre Bráz; Genival de Caboquinha, no Mercado
Público conhecido pelos boêmios da época como “barracão”, na fazenda de Senhor
de Duó entre outras que não mim vem à memória agora.
Severino dos Calugas morreu em outubro do ano de 1988 e
foi sepultado no cemitério Pe. Carlos Theisen
na cidade de Viçosa/RN cujo cortejo fúnebre fora acompanhado pelas lágrimas dos
seus admiradores (destas, a do
moleque faminto, raquítico e JÁ curioso e CONTRARIADO que hoje escreve) e
ao som da melodia da música “meu querido, meu velho, meu amigo” do cantor
Roberto Carlos.
Taí o texto número 12.
Mesmo no doze.
É de imensa honra ver a história desse grande artista que, embora com recursos simples e limitados, conseguia extrair a mais pura cultura sertaneja. Fico ainda mais honrado em saber que se trata do meu Bisavó! Agradeço ao blog por disseminar essa histórica tão rica.
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