sexta-feira, 20 de novembro de 2015

As parteiras dos filhos ausentes.



                     
                        
           



Por Aurivânio Andrade.

           O Sertão Nordestino produziu no passado, várias figuras emblemáticas; todas dignas do nosso respeito, da nossa admiração e do nosso reconhecimento. Dentre estas, trago a figura do poeta e cancioneiro Elizeu Ventania, do violeiro e andarilho Cego Aderaldo, do meu vizinho Cícero Turíbio, Patativa do Assaré, Zé Dendê – uma figura folclórica que se dizia virá lobisomem; este conheci de perto aqui em Viçosa, na casa do seu amigo Zacaria Belarmino, e tantos outros que de “ouvir dizer” despertou a minha imaginação e a minha curiosidade desde os meus tempos de criança. 
          O sertão de Viçosa também teve suas figuras emblemáticas. Assim como Rodolfo Mafaldo - pai adotivo do meu pai – Francisco Augusto Cezar, tivemos ainda Raimundo Torres, Bráz de Souza Barra, Severino Monteiro entre outros que a minha memória mim trai agora.
Todavia, trago ao conhecimento das gerações mais novas em meio ao resgate, não digo do esquecimento, mas da substituição injusta pelos mais velhos, um pouco da história de outras figuras emblemáticas que deixaram suas “pegadas” no seu torrão e na vida do seu pobre e humilde povo.
          Refiro-me, a mulher sertaneja, ou melhor, as MÃES sertanejas. E por falar em mães sertanejas, me lembrei de seis MÃES extraordinárias que contribuíram, mesmo que de forma anônima para a formação e a multiplicação do nosso povo. Leia-se: VIÇOSENSE. Dessas seis, quatro tive o privilégio de conhecer de perto, e as outras duas, de “ouvir contar”. Essas Mães se distinguiam das demais à época, por três motivos: Pela coragem e “sabedoria”, pela solidariedade com as demais e pela quantidade de filhos que elas abençoavam. Tanto assim o era, que as mesmas eram conhecidas por “Mãe”.  Mãe Preta, Mãe Anja, Mãe Raimunda, Mãe Luzia, Mãe dos Anjos e Mãe Licor; sendo esta última, minha avó materna.
          Essas mulheres foram as que mais contribuíram – diga-se de passagem, na saúde do nosso município. Mesmo numa época dificílima, mas que ainda existia respeito, admiração, valorização e patriotismo entre o nosso povo. As mesmas não tinham salários, não tinham pretensão a cargos políticos e nem a emprego público. Não escolhiam o horário e nem os dias da semana para quem necessitassem de suas ajudas. As mesmas eram solidárias diante do seu povo.
          O Antropólogo e Professor carioca Darcy Ribeiro antes de morrer, manifestou a vontade de dar uma aula a uma criança. Durante essa aula, talvez a última de sua vida, o mesmo falou que tinha sido ele um dos principais responsáveis pela fundação da Universidade de Brasília (UNB) e do Sambódromo do Rio de Janeiro, e logo indagou a criança, se ela saberia a importância dessas duas obras importantíssimas para os cariocas. A criança não sabendo responder, ele logo tratou em explicar: “meu filho, a Universidade é um espaço onde está presente a Cultura Erudita; e o Sambódromo é onde estar presente a Cultura Popular. As duas formas de culturas são indispensáveis para o crescimento da vida de qualquer povo”.
Lendo a história do grande professor Darcy, corroboro com o mesmo pensamento daquele que foi um grande incentivador da educação, da colonização e da liberdade do seu povo. E aqui já adianto que apesar de está frequentando um desses espaços onde está presente a Cultura Erudita, representada por Advogados, Juízes, Promotores, Sociólogos, Psicólogos, Professores etc; jamais perderei o foco e o orgulho de resgatar, propagar e defender a minha principal fonte de inspiração e admiração que é a Cultura Popular. E para não perder o foco e nem o orgulho, volto as MÃES sertanejas.
          A mulher sertaneja de outrora, era - eu disse ERA - símbolo de uma mulher forte, determinada e corajosa. Pouquíssimas delas ainda fazem parte do nosso cotidiano, todavia, a maioria ficaram só nas lembranças dos seus filhos e dos seus raríssimos netos que jamais esquecerão os seus feitos. E por falar em feitos – eu disse em FEITOS e não enfeite mim debruço no leito da minha memória e nos dizeres dos meus ancestrais para narrar um pouco da história dessas Mulheres até em tão ANÔNIMAS. 
Entretanto, antes de discorrer sobre o relato não posso esconder dos meus raríssimos leitores ou que sejam curiosos, que toda obra humana por si só é imperfeita, inacabada e defeituosa, no entanto, outros poderão da continuidade enriquecendo este pequeno relato (só não me venham com politicagem e/ou babação), mas, de grande contribuição (deste que vos escreve) para as gerações futuras ou quem sabe a geração presente. Eis um dos principais feitos dessas MÃES:
          Em INDETERMINADAS horas do dia o que fosse da noite, os maridos das parturientes, ou seja, das mulheres que estavam em trabalho de parto da nossa até então, Vila Viçosa, chegavam montados em animais o que fossem a pé chamando-as para ajudarem no trabalho de parto de suas mulheres. Essas heroínas de pronto atendiam o chamado e logo deixavam seus filhos menores na companhia dos filhos mais velhos ou que fossem dos seus maridos e saíam acompanhadas com o portador; sobre o frio da madrugada em meio à escuridão, o silêncio da mata fechada, o RESPEITO recíproco e as águas rasas dos riachos Dormente e Forquilha com destino a casa da parturiente. Chegando lá, era nítido ver na face da parturiente o alívio dessa espécie de “socorro médico” que tardava, mas nunca lhes faltavam. Como o percurso era longo e feito numa vereda de mata fechada em meio a pedras, cipós, buracos pelo caminho, ao chegarem à casa da parturiente a mesma (parturiente) muitas vezes já estava em trabalho de parto e elas (parteiras) não tinham tempo a perder. Logo, requisitavam um pequeno banco de madeira. Na falta deste, uma “cuia de oito” (espécie de uma caixa de madeira quadrada cuja serventia servia para medir feijão ou milho), que depois de colocada com a "boca" para baixo, fazia a mesma função do banco onde as parturientes eram orientadas a sentarem. Logo em seguida, algumas delas vestiam as camisas dos maridos das parturientes pelo avesso e pediam que os mesmos (maridos) ajudassem segurando-as por trás, (pelas costas). Começava de fato o trabalho de parto. Depois de muitos esforços em meio a muitas dores, por sinal, “dores esquecidas” como dizia minha Vó, a criança começava a nascer. Nesse momento, as “parteiras” exerciam ainda mais seu trabalho, ajudando na retirada das crianças e logo em seguida cortando o cordão umbilical, cujo instrumento cortante era uma tesoura desinfetada com álcool que as mesmas utilizavam para os cortes. Cortado o cordão umbilical, os dois substantivos - a tesoura e o “cordão” tinham destinos diferentes: A tesoura era colocada em cima de uma tábua em forma de cruz onde aquelas famílias eram orientadas a não mexerem. ”Essa tesoura deve ficar aqui durante três (03) dias sem ninguém mexer”! Avisavam as “parteiras”. Já o cordão umbilical era enterrado em um curral de gado, sobre a crença de que aquela criança ia ser abençoada no futuro.
Se houvesse complicações durante o trabalho de parto, o que às vezes ocorria, era preciso muitas rezas e pedir ajuda a duas parteiras de Portalegre/RN conhecidas por “Chiquinha da Maternidade” e “Agá”. Essas duas prestavam seus “serviços médicos” de maneira – digamos mais avançados do que as daqui, para os padrões da época.
Terminado o trabalho de parto, o mesmo portador que veio buscar a parteira era o mesmo que vinha deixá-la, que fosse pela madrugada o que fosse já pelo amanhecer do dia, a depender do parto.
          As parteiras dos filhos ausentes de Viçosa apesar dos seus inúmeros feitos, ou melhor, “PARTOS”, continuam até hoje no rol do esquecimento do nosso povo, principalmente dos “seus filhos” que ocuparam e  que ainda hoje ocupam as cadeiras do legislativo viçosense e que nunca enviaram um projeto de lei se quer até a data de hoje 15/02/2015, data do meu aniversário para fazer justiça nomeando-as em qualquer Órgão Público, principalmente os ligado a SAÚDE do nosso município.
Entretanto, trago ao conhecimento dos mais novos e ao mesmo tempo, reativos nas lembranças dos mais velhos e deles espero ONDE QUER QUE EU ESTEJA à cobrança das provas do que digo!

Taí o texto Nº 13. Mais uma vez enfrentando o preconceito, ignorando a visão míope do meu povo e lambendo uma rapadura para apresentar as provas do que digo!

Boa reflexão! De texto e de imagens.

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