Irene e os méritos que não lhes neguei em vida.
Irene Maria da
Conceição. Conhecida
pela minha geração como Dona Irene.
A mesma foi Diretora da nossa saudosa escola primária
Nossa saudosa escola primária onde Dona Irene fora Diretora. A principal arena da educação infanto juvenil da nossa Viçosa de ontem.
Por Aurivânio Andrade.
Sem nenhuma pretensão literária e sem
querer “puxar saco” de ninguém, até
porque eu odeio esse substantivo e esse adjetivo comum de dois gêneros; volto a
falar do meu povo. Sobretudo, do povo que fizeram parte da minha infância e que
a minha acurada lembrança jamais me deixará esquecer.
Hoje, o meu compromisso com a história
do meu povo - leia-se: VIÇOSENSE,
me leva a uma das descendentes das famílias de Viçosa, sobretudo, a história de
uma descendente da família “Pedro”
cujo nome da família, por coincidência nomeei o meu filho caçula de nome - PEDRO.
A família “Pedro” apesar de ser uma família simples e humilde foi a
que mais contribuiu para formação do nosso povoado, inclusive, DOANDO a MAIOR parte de suas terras para a construção da nossa capela nos
ido dos anos 30, e consequentemente, para as construções das primeiras casas
que deram origem e formação ao nosso povoado. Se provocado, mostrarei os FATOS que comprovam o que
estou dizendo.
Mas não é da família Pedro, que eu quero falar. Não. Quero
falar de Irene, ou Dona Irene como
a minha geração numa forma de respeito chama até hoje.
Dona Irene, assim como alguns dos nossos VERDADEIROS HERÓIS, que graças a mim,
foram resgatados do anonimato, inclusive sem nem um valor financeiro, apenas
por reconhecimento, respeito, admiração
e patriotismo, também deixou sua valiosa contribuição, na agricultura, na saúde, na
educação e no Cartório Único das
Pessoas Naturais da nossa Viçosa de ontem onde trabalhou por mais de 18
anos como tabeliã substituta; e que hoje
se mantém esquecida nas mentes “brilhantes”
de um povo que me parece não ter passado, ou si tem, tentam esconder o único
passado que tem. Pra onde for se constata. A mesma é filha de Dão Pedro (In memoriam), um dos maiores
agricultores da nossa cidade e também fora(ô) um dos mensageiro do profeta
popular Manoel Luiz dos Santos,
conhecido pelo agricultores da época de “Mané
Luiz”. Pois o mesmo, era encarregado de trazer da feira de Umarizal, panfletos
com profecias do tal profeta, sobre como seria o inverno do ano que se
iniciara. “Vou pedir a Dão Pedro para trazer uma “foinha” de “Mané Luiz” (sobre o
inverno desse ano), amanhã, segunda feira.” Dizia meu pai; a eu, e ao meu irmão Adeiton Andrade (In memoriam), lá no
roçado. Dão Pedro, veio a falecer
aos 86 anos com a alcunha de “O Homem do
campo” devido a sua paixão, a sua fé, a sua esperança e pela sua
assiduidade com a atividade rural. Mas isso é outra história que deve ser
contada noutro momento, quem sabe até, por outros defensores do nosso povo, da
nossa cultura e da nossa Viçosa. Se é
que surjam!
É sabido por todos, que a educação do
nosso país sempre fora(ô) privilégio da classe dominante. Até aqui não há o que
se negar. Viçosa, em épocas passadas, não era diferente. Aqui só quem tinha
esse privilégio eram os filhos de algumas famílias que se diziam “nobres”. Nobres pra os outros,
menos pra mim; porque sempre achei que isso não passa de algo cultural e que apesar
de negar, torço para um dia não ouvir nem falar, quanto mais defender, elogiar, paparicar,
babar ou sei lá o quê.
Todavia, sempre existiu alguém
inquieto como eu e que queria algo mais. Alguém que queria ajudar o seu povo
duma forma ou de outra. E assim ocorrera com Dona Irene. Mesma tendo que enfrentar as dificuldades da vida, o descrédito
do seu próprio povo, sempre procurou a trabalhar e a estudar. Durante os anos
50 e início dos anos 60, ela ainda
vivia trabalhando no meio rural. A mesma trabalhava na companhia de suas outras
irmãs, plantando e colhendo algodão, milho e feijão. Que fosse no Sitio
Queitatú, a extremo leste ou que fosse no Olho’dagua do mufumbo, a extremo
oeste da nossa pequenina vila. Nessa época, só existia aqui na nossa cidade, o
3ª ano primário. Ou o “3º ano velho” como de maneira
enfática a mesma relatou pra mim. No entanto, Dona Irene queria
abandonar a agricultura e continuar com seus estudos. Foi aí que a convite de
amigos, ela fora(ô) morar na cidade de Mossoró/RN, onde lá, concluíra o 4º ano
primário na Escola “Ambulatório
Cardeal Câmara” pertencente à Diocese
de Santa Luzia de Mossoró. Depois, ainda no início da década de 60, concluíra
o 5º ano primário no SESI- Serviço Social da Industria, também em
Mossoró; onde lá aprendera a costurar, bordar, pintar etc.. De volta a sua
terra natal, ainda no início dos anos 60,
ela fora(ô) convidada para exercer o magistério nas cercanias do Apodi/RN. Depois
de ter prestado relevantes serviços ao município apodiense, no início dos anos
70, retorna mais uma vez a sua terra natal para também exercer o magistério na
Escola Municipal “Laurindo de Paiva”
(sitio brejo seco), zona rural do nosso município; exercendo esse ofício até o
ano de 1975. Nessa época, quem tinha
um filho ou qualquer tipo de parente com essa profissão ou outras profissões
diversas era motivo de orgulho,
nobreza e admiração. Tanto para os pais,
como para o seus munícipes. Hoje, é motivo de invejas e subestimação. Mesmo camuflada, mas eu sei que há. Nessa mesma época também, Dona Irene fora(ô)
auxiliada por Socorro Lopes ou Dona Socorro, madrasta do meu pai e
esposa de Rodolfo Mafaldo,
fazendeiro e líder político, sendo esta, proprietária de uma pequena farmácia
que ficava localizada na sua própria residência no início da Rua Augusto Gomes de Paiva, a exercer o
ofício de “enfermeira”
juntamente com Francisco Antônio Rodrigues
(Chico Antônio), inclusive, ambos não mediram esforços para os que
necessitara das suas ajudas. Por falar em Dona
Socorro, ela juntamente com Dona
Irene e outros, foram as que mais lutaram para criação do nosso primeiro Posto de Saúde, local onde a população
de nossa cidade recebiam os primeiros atendimentos médicos. O mesmo era denominado
de “Mini posto” e ficava
localizado no início da Rua Ozéas Pinto, palco das minhas brincadeiras quando
criança. Quem tem mais de 40 anos e é de VIÇOSA,
sabe muito bem o que estou dizendo.
Em
1976, Dona Irene é nomeada para exercer
o ofício de Bibliotecária na Biblioteca
Municipal Francisco Solano Lopes,
que funcionava na parte interna da Prefeitura. Na mesma época, ela também exercera
o magistério na antiga e já demolida escola Padre Alexandrino Suassuna de Alencar, por sinal a escola onde
conclui o meu ensino fundamental. O ensino de lá, à época, equivaleria ao
ensino médio de hoje. Desde que o ensino médio de hoje, seja bem feito.
No ano de 1977, é convidada para assumir a vaga de uma professora (só não
cito o nome, por que pra mim não merece), na antiga Escola Estadual Ozéas Gomes Pinto. No ano seguinte, em 1978, assume de maneira voluntária e
sem nenhuma remuneração, a direção da referida escola como Diretora substituta
de Zilá Fernandes, que por motivos
de força maior, deixara a direção da escola e ia morar na capital do estado. A
entrega da direção da escola, ocorrera na cidade de Martins/RN. No início do
ano seguinte (1979), todos os
diretores das Escolas Estaduais vinculadas ao NURE (Núcleo Regional de
Ensino), hoje chamada de DIRED (Diretoria Regional de Educação), com
sede na cidade de Umarizal, se reuniam para apresentarem uma espécie de “balanço do ano letivo”. Naquela
reunião, Dona Irene fora(ô) a que
mais se destacou pela sua capacidade de organização, compromisso e competência
frente a nossa pequenina escola. Contudo, diante do seu desempenho, a diretora Salete Maia, chefe geral do Núcleo Regional de Ensino (NURE), nomeava oficialmente Irene Maria da conceição para
assumir a Direção oficial da Escola
Estadual Ozéas Gomes Pinto onde ficou a frente da mesma como diretora, por
um período de 20 anos. Mérito que
dispensou os “mimos políticos” como se ver hoje, e a moeda eleitoral do pleito
seguinte. Começava uma nova fase na vida educacional infanto-juvenil da
nossa Viçosa. E eu, anos depois estava lá. Conferindo tudo ou quase tudo.
Órfãos do poder público. Assim
sobrevivera a nossa pequenina escola e a maior parte das nossas famílias. Tudo
dependia da boa vontade dos outros. Ou quase tudo. Por sinal, a primeira
máquina datilografa que sugira na escola, uma vez que todos os
trabalhos(documentos) eram manuscrito, ou seja escrito a mão, fora(ô) Dona Irene
quem pedira pessoalmente a Edgar Martins, funcionário da Secretaria Estadual de
Educação à época, e sabedor das dificuldades que a nossa escola enfrentava, e
que logo atendera ao seu pedido.
Início de mais uma semana. Como não existira
informações acessíveis a todos como existe hoje, Dona Irene, logo acordara cedo pra alcançar as margens da rodovia
ou que fosse “rodagem”, como nossos pais chamara a estrada que ainda liga hoje a cidade de Viçosa a Umarizal, ou
que fosse pela estrada vicinal (de pedregulhos cipós e poeira), com passagem
pela Fazenda Caieira, os carros que faziam o percurso com destino a cidade de
Umarizal. Sede do NURE. A mesma
repetia essa façanha duas ou três vezes por semana no intuito de resolver questões
referentes aos anseios da escola. Fosse à requisição de mais merenda para
escola, fosse material de limpeza, fossem reuniões para discutirem os problemas
que sugira, enfim; cedo ela já estava lá. Em muitas dessas viagens, não era
raro Dona Irene “perder” os carros
da feira de volta, só retornando a sua residência por volta das 14:00hs – e sem
almoço, a depender de carona e da solidariedade dos pouquíssimos proprietários
de carros que existia naquela época; chegando muitas vezes a ser transportada
em cima de tratores o que lhe causava cansaço, mas ao mesmo tempo, satisfação
por ter conseguido autorização para aumentar o estoque da nossa merenda que servira
para alimentar aquelas criança raquíticas que assim como eu, logo sentira sua
falta e ao mesmo tempo me indagava: “Hoje Irene não tá aqui? Será pra onde ela
foi? Será que ela foi buscar mais merenda? E pra minha alegria; minha e
dos meus colegas, ela fora(ô). Chegada a merenda na Prefeitura, local para onde
a mesma era mandada era preciso um dos funcionário (O Prof. Chico de Estevão) fazer o transporte da mesma, em lombo de
jumento até a escola, cujo local já estava a espera, a nossa Diretora e a
clientela mais interessada.
Durante a passagem de Dona Irene como Diretora da nossa Escola, a mesma (escola) viveu o seu
auge cultural. Ou melhor, a nossa Viçosa
vivera o seu auge cultural. Todas as datas eram comemoraras pelos alunos, pela escola
e pelas famílias; inclusive, estas últimas, eram parceiras assíduas e
recíprocas na educação dos seus filhos e no patriotismo da nossa cidade e do
nosso povo. Nenhum queria se sobrepor ao outro. Éramos solidários uns aos
outros. Bem diferente de hoje. Ainda com Dona Irene a frente da nossa escola, comemorávamos
tudo: O dia da árvore, por sinal, nesse dia, todos os alunos eram orientados
por Dona Irene e pelos professores a levarem uma muda de qualquer árvore para
plantarmos no pátio da escola. Ao mesmo tempo que íamos plantando, íamos
cantando uma música que apesar dos anos e da idade já estarem avançando, ambas não
conseguiram ainda apagar da minha privilegiada memória. Eis o refrão: [...] “Plantemos árvores plantemos, no chão da
pátria rir em festa, verdes palácios nós erguemos para os cantores das
florestas[....]” e aí prosseguíamos. Comemorávamos a Páscoa, o dia do
Índio, o dia do Soldado, o dia da Bandeira, o dia do Folclore (por sinal,
demorei muito pra saber o que significava essa palavra), vinham depois, o mês
junino, o dias das MÃES, o dia dos PAIS, o dia do Professor, o dia da Criança,
a semana da Pátria, inclusive, ensaiávamos semanalmente (as quintas feira) o
hino da Independência, o hino da Bandeira e o hino Nacional Brasileiro, onde
naquela ocasião éramos orientados por Dona Irene e pelos nossos professores a
ficarem de frente para as Bandeiras (do Brasil e do nosso Estado), que já
estavam hasteadas por Tereza Bruno no
pátio da nossa escola. “Todos olhando para as Bandeiras; firme, e
com a mão direita em cima do peito esquerdo!”, ordenara Dona Irene; a
nossa Diretora. Por falar ainda na semana da pátria, Dona Irene enquanto esteve
como diretora, foi protagonista dos desfiles cívico mais bonitos e mais bem
organizado que a nossa Viçosa já vivera. Como já foi dito, tudo a depender dos
outros. Do fardamento dos alunos, aos demais ornamentos que se fizera
necessários. Nenhuma pataca do poder público. Nem pataca e nem presença. O que
difere de hoje onde tudo tem que ser custeado pela prefeitura. “Ou a
prefeitura ajuda ou não vai ter nada”! É isso que ultimamente tenho
ouvido.
Por fim, agradeço e ao mesmo
tempo me solidarizo com a nossa ex Diretora Dona Irene. Agradeço, pela amizade sincera e respeitosa que tivera
com a minha saudosa MÃE, Dona Bernadeth (In memoriam), inclusive,
quando conversávamos na área da sua casa e falávamos dessa amizade que tivera
com a minha saudosa MÃE, não contive as lágrimas e chorei. Mas, não chorei
porque sou um homem “frouxo”. Não. Chorei por me lembrar dela (minha MÃE), e
das muitas vezes que ela saía de casa e mim deixando na companhia da minha irmã
mais velha, ia me matricular mais uma vez, mais um ano naquela saudosa escola
em que sua amiga e comadre era a Diretora;
cujo objetivo seu, era de um dia ver o seu quinto
filho alcançar voos mais altos; a altura de poder resgatar a história do
seu povo e da sua cultura que hoje quase ninguém se arrisca mais. Agradeço
ainda, a Dona Irene, pelo muito que ela fez; principalmente pela Agricultura, pela Saúde e
pela EDUCAÇÃO do nosso município;
mesmo numa época dificílima em que as porta do poder público estavam todas trancadas;
mas como vi de perto, permito-me dizer que ao mesmo tempo “as janelas” da
solidariedade daquele nosso povo de ontem, permanecera abertas pra acolher essa guerreira, essa patriota que nunca deixou a
sua cidade natal; que nunca escondera as suas raízes e que nunca quis se
sobrepor e nem a “aparecer” diante das condições precárias e esquizofrênicas
que vivera o nosso povo, por sinal, uma esquizofrenia que começara de forma
sutil e que ultimamente vem aumentando, e aumentando muito, tendo inclusive, já
corroído e comprometido o bem estar do nosso próprio povo. Em todos os seus aspectos.
Econômico, social, político, cultural e outros. Por outro lado, me solidarizo
pelo NÃO RECONHECIMENTO dessa principal Ícone da nossa educação, que apesar dos
seus grandes feitos pela nossa cidade, NUNCA ouvi em nenhuma apresentação
cultural, em nenhum discurso político (principalmente na tribuna legislativa), em
nenhum movimento escolar ou da saúde fazerem uma homenagem se quer, ao nome
dessa VIÇOSENSE NATA, que sem dúvida nenhuma, participou de momentos marcantes da
nossa vida, inclusive, contribuindo para formação do caráter da maioria dos
professores, pais e das mães de famílias de bem da nossa Viçosa de ONTEM, de
HOJE e de SEMPRE.
Hoje, Dona Irene aos 72 anos
está sendo vitimada por fortes dores reumáticas devido a um reumatismo que quase
lhe tirou o sorriso e lhe ofuscou o semblante. A mesma vivi da sua digna e
merecida aposentadoria numa casa simples que está encrava nas terras dos seus
ancestrais. Os ancestrais da família patriarca. Os ancestrais da família PEDRO, que quer dizer pedra, rocha.
Pronto. Taí mais um texto. O de Nº 17. Como dizia Dona Irene quando professora - “Nas fora 8”.
Boa reflexão. De texto e de imagens.
Parabéns Aurivânio !Fiquei emocionada ao ler seu texto.
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